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A nossa identidade é feita de memórias

Empresária que desenvolve produtos biográficos explica a importância do registro de nossas histórias para manter o senso de pertencimento e de afetos




O Portal Brasília News nasceu da vontade de investigar a identidade cultural de Brasília, de modo a revelar os aspectos humanos da cidade para além da agenda política, tão marcante no imaginário nacional sobre a Capital.


E a forma que encontramos de fazer isso é registrar, em texto e imagem, o cotidiano de Brasília e os diversos olhares, sentimentos e vivências de seus moradores. Os lugares escondidos entre um monumento e outro, as esquinas imaginárias, as tribos urbanas, a relação com o Lago Paranoá são alguns dos elementos que surgiram neste registro que parece delinear um mosaico colorido e diverso que compõe o tecido social de que Brasília é feita.


Ao completarmos um ano de existência, o Portal Brasília News convida pessoas que, de alguma forma, desenvolvem trabalhos que ressoam com o nosso objetivo: contribuir para a formação da memória afetiva da Capital Federal.


Neste primeiro texto, a jornalista e empresária Bárbara Reis, hoje residente em Portugal, nos explica o poder da memória na formação da nossa identidade:




"Somos a nossa memória"



por Barbara Reis*



Alice e seu livro de memórias. Foto: Arquivo Pessoal

Era dezembro de 2020 e eu estava montando a árvore de Natal com a minha filha, quando notei que o brilho nos olhos dela era de quem vivia aquela experiência pela primeira vez. Ela estava com seis anos de idade, mas já não se lembrava mais dos natais passados. Testemunhei inúmeros episódios como esse ao longo daquele ano; ela havia se esquecido de pessoas, sabores, lugares e momentos.


Alice estava vivendo o que chamamos de “amnésia infantil”, que acomete quase todos nós. Por motivos que os cientistas ainda buscam respostas, o fenômeno faz com que as lembranças dos fatos relacionados aos nossos primeiros anos de vida se apaguem, mesmo que fiquem os aprendizados mais profundos e vitais. Trata-se de um assunto complexo e, ao mesmo tempo, fascinante, pois é incrível como as lembranças da nossa infância, mesmo não sendo explícitas, possuem uma influência poderosíssima na nossa formação como adultos.


As memórias mais enraizadas são, muitas vezes, a chave na busca pelo autoconhecimento ou na própria projeção do nosso futuro. Mas é preciso ter cuidado, pois existem também as “memórias falsas”, que nos parecem tão verdadeiras que é difícil acreditar que sejam de fato implantadas. A Alice uma vez insistiu comigo que havia estudado numa escola na qual ela nunca havia sequer entrado! Tenho também uma amiga que afirma ter adotado um cão quando era criança, mas a família inteira nega o “fato”. Daí a importância do registro. Acredito que toda história de vida é digna de uma biografia e que deveria ser escrita desde a infância.


Do outro lado, temos os idosos, que também veem suas lembranças se esvair. Doenças que afetam a memória são, para mim, as mais cruéis. Outro dia, fiquei refletindo um bocado sobre o que o Chris Hemsworth disse no documentário Sem Limites: “Se eu não tiver as minhas lembranças, será que eu existi um dia? Nossas memórias deveriam durar para sempre. Elas são o que nos moldam e fazem ser quem somos”. O ator, de 39 anos, conhecido por interpretar Thor nos filmes da Marvel, anunciou recentemente que daria uma pausa na carreira, pois descobriu que tem predisposição genética para desenvolver Alzheimer.



Lembranças trazem significado e direcionamento

É interessante pensar que sem os nossos braços, os nossos cabelos ou os nossos sentidos, há impactos sobre como nos reconhecemos, mas a nossa essência ainda está lá de alguma maneira. Porém, sem as nossas lembranças, quem somos? Não é uma questão de viver o passado, mas da importância que toda a nossa carga de vida traz para o presente e o futuro.


No meu trabalho, quando me sento para conversar com pessoas que nos dão a oportunidade de conhecer sua trajetória, sinto a terapia que é para elas estar ali, apenas reafirmando o significado da sua própria existência. É sempre reconfortante, inspirador e carregado de emoção. Registrar e preservar a história, afinal, é deixar um legado, é eternizar a vida.


*Barbara Reis é jornalista e co-fundadora da Foi Assim, empresa especializada em desenvolver biografias pessoais e corporativas, incluindo livros de memórias infantis, biografias de famílias, histórias de casais, jornadas de empreendedorismo, diários de viagens e diversos outros formatos (www.instagram.com/foiassimoficial / www.foiassimoficial.com.br).

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