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Uma cidade também é feita de matéria sonora

Nesta Carta à Brasília do mês de maio, um espanhol viajante do mundo explica sua relação afetiva com a cidade

O encantamento pelo céu de Brasília é unânime nas Cartas à cidade. Foto: arquivo pessoal


"Uma cidade também é feita de uma certa matéria sonora que ela própria produz. São os sons que perpassam as ruas vindos da fala de seus habitantes, do barulho dos carros, dos aviões que travessam o céu das cidades. Brasília nao é uma cidade barulhenta como Rio ou Sao Paulo. Uma das coisas que a gente mais valoriza aqui é poder escutar o canto dos pássaros: são incontáveis os que te visitam. Uma cidade também é a sua música, seja ela típica da região ou da cidade ou simplesmente aquela que seus moradores gostam de escutar em casa, nos bares ou nas salas de shows.


Eu queria falar aqui hoje da música que representa para mim, Brasilia. Qual é o som com o qual eu identifico/encontro você? Na verdade não é uma pergunta fácil. Porque Brasilia foi uma cidade criada por brasileiros de diversas origens, e cada um deles trouxe músicas muito variadas e diferentes. O que adicionou ainda mais riqueza num país com um universo musical como o do Brasil.


Diante de minha busca, uma primeira resposta óbvia seria identificar o rock como uma criação original da cidade. Musicalmente Brasilia explodiu nos anos oitenta e noventa, com nomes de cantores como Renato Russo e Cassia Eller, os quais viraram ícones nacionais do rock tornando a contribuição de Brasilia fundamental para o rock nacional.


Já numa segunda resposta eu assinalaria a música sertaneja. O DF fica dentro dos limites do Estado de Goiás e bem perto de sua capital, Goiânia, que é a capital do “sertanejo”. Essa música vinda do interior, reconhecida como cultura caipira colore muitos pontos da cidade.


Você, Brasília, também poderia ser identificada pelos ritmos brasileiríssimos de raiz como o samba, pela bossa nova ou ainda por qualquer um dos ritmos nordestinos como o frevo, o maracatu e por seus incontáveis bailes de forró e outras danças. Tambem de todos os ritmos e músicas do Sul, Norte ou Oeste do país.


Também lembro de todas as músicas que muitos artistas da MPB como Caetano, Gal Costa e Djavan dedicaram e fizeram pensando em Brasília. Entre todas, eu prefiro a do grande violinista mineiro Toninho Horta, intitulada “Céu de Brasilia”, que fala da experiência única de contemplar o seu céu.


Alunos em plena aula no Clube do Choro de Brasília. Foto: Arquivo Pessoal


Mas para mim, Brasília, a música a qual traduz você é o choro. Mesmo ele sendo originário do Rio de Janeiro e do sudeste do país, o choro se tornou peça fundamental do repertório da música brasiliense. Uma contribuição importante para isso foi a criação do Clube do choro, um dos mais importantes do país, e de sua escola, que ja vem formando gerações de músicos extraordinários. A gente pode ouvi-los nas muitas rodas de choro que existem na cidade como o popular chorinho no eixo todos os domingos.


Mas não é só essa a razão porque eu escolhi o choro. Qualquer um que chega aqui vai se identificar com diversas músicas , porém os extraordinários pores de sol que aquarelam o seu Céu, para mim tem um "não sei o quê" de agradável e melancólico, uma mistura da saudade brasileira e portuguesa, daí um "não sei o quê" que me levou a esses chorinhos que me fazem sonhar com douçura...


Damian Lunna formou-se em Direito e Política em sua cidade natal, Valência, na Espanha. Trabalhou na Comissão Europeia em Bruxelas, tempo em que viajou pelo mundo inteiro. Apaixonado pela musica brasileira, mora em Brasilia desde setembro de 2021, onde trabalha na Embaixada da Uniao Europeia

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